Reforma Tributária e a Tributação dos Aluguéis: O Desafio das Pessoas Físicas e a Oportunidade das Holdings Patrimoniais


Aprovada pela Emenda Constitucional nº 132/2023 e regulamentada pela Lei Complementar nº 214/2025, a Reforma Tributária inaugura um novo sistema de tributação sobre o consumo no Brasil, por meio da criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS).

Embora o discurso oficial destaque a simplificação e a neutralidade, um ponto sensível merece análise detida: a inclusão das pessoas físicas locadoras de imóveis como contribuintes de IBS e CBS em determinadas circunstâncias. Tal inovação provocará um expressivo aumento da carga tributária, tornando necessário avaliar alternativas de planejamento, como a constituição de holdings patrimoniais.

  1. A Tributação Atual da Pessoa Física Locadora

Atualmente, a pessoa física que aufere rendimentos de aluguéis está sujeita apenas ao Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), pela tabela progressiva, com alíquota máxima de 27,5%.

Não há incidência de ISS, PIS, Cofins, CSLL ou IRPJ. A carga efetiva, considerando deduções, varia entre 20% e 25% da renda.

  1. O Novo Regime da LC 214/2025

Os arts. 251 a 253 da LC 214/2025 criam hipóteses em que pessoas físicas passam a ser contribuintes do regime regular do IBS e da CBS. Isso ocorrerá quando:

  1. A receita anual com locação, cessão onerosa ou arrendamento de imóveis superar R$ 240.000,00 e envolver mais de 3 imóveis distintos;
  2. Houver alienação ou cessão de direitos sobre mais de 3 imóveis no ano;
  3. Ocorrer a alienação de mais de 1 imóvel construído pelo próprio alienante nos 5 anos anteriores.

Nesses casos, a pessoa física não pagará apenas o IRPF, mas também o IBS e a CBS, cuja alíquota estimada total varia entre 25% e 27% sobre a receita bruta de aluguéis, sem possibilidade de créditos a compensar.

  1. O Impacto Prático: Comparativo da Carga Tributária

Exemplo: receita anual de R$ 360.000,00 em aluguéis (R$ 30.000,00 mensais), distribuídos em 5 imóveis:

  • Situação atual (2025):
    Apenas IRPF (≈ 20% a 25%) → R$ 72.000,00 a R$ 90.000,00/ano.
  • Situação futura (pós-IBS/CBS):
    IRPF (R$ 72.000,00 a R$ 90.000,00) + IBS/CBS (≈ 25% = R$ 90.000,00).
    Total = R$ 162.000,00 a R$ 180.000,00/ano.

A carga tributária praticamente dobra, podendo alcançar 45% a 50% da renda.

  1. E a Holding Patrimonial?

Uma dúvida recorrente é se a constituição de uma pessoa jurídica (holding patrimonial) afastaria a incidência do IBS e da CBS. A resposta é: não.

A LC nº 214/2025 inclui expressamente no campo de incidência do IBS e da CBS as operações de locação, cessão onerosa e arrendamento de bens imóveis realizadas por qualquer contribuinte do regime regular, e nisso estão compreendidas as pessoas jurídicas.

Portanto, a holding patrimonial também estará sujeita ao IBS e à CBS sobre a receita de aluguéis.

  1. Onde está a vantagem da Holding?

A vantagem da PJ não reside na isenção do IBS/CBS, mas em três fatores decisivos:

  1. Regime do Lucro Presumido
    • IRPJ + CSLL com base em presunção de 32% da receita → carga de 10,88%.
    • PIS/Cofins cumulativos = 3,65% sobre a receita bruta.
    • Carga total ≈ 14,5% sobre o faturamento.
    • Esse regime tende a ser mantido até a transição plena para IBS/CBS (2033), e mesmo após, a PJ poderá utilizar créditos do IBS/CBS.
  2. Aproveitamento de Créditos de IBS/CBS
    • Diferente da PF, a PJ poderá se creditar de IBS e CBS relativos a despesas com manutenção, reformas e serviços vinculados à atividade imobiliária.
    • Esse mecanismo reduz sensivelmente a carga líquida, compensando parte do impacto do IBS e CBS.
  3. Distribuição Isenta de Lucros
    • Após a tributação na PJ, os lucros distribuídos aos sócios permanecem isentos de IRPF, encerrando a carga no âmbito da pessoa jurídica.

Assim, embora a holding não escape do IBS/CBS, ela possui instrumentos de mitigação e mantém uma carga global muito inferior à da pessoa física em atividade de grande porte.

  1. Benefícios Adicionais da Holding

Além do aspecto tributário, a holding patrimonial oferece:

  • Planejamento sucessório, permitindo a antecipação e organização da herança com economia de ITCMD;
  • Proteção patrimonial, segregando riscos pessoais dos sócios;
  • Gestão centralizada, com maior eficiência administrativa e contábil.
  1. Conclusão

A Reforma Tributária, ao alcançar a locação de imóveis por pessoas físicas, cria um verdadeiro divisor de águas: o que antes era tributado exclusivamente pelo IRPF (até 27,5%), passará a suportar também IBS e CBS, cuja alíquota estimada varia de 25% a 27% sobre a receita bruta, levando a carga total para patamares próximos de 50% da renda.

Embora as holdings patrimoniais também estejam sujeitas a essa nova tributação, sua estrutura tributária, sucessória e administrativa as torna significativamente mais vantajosas. Com elas, a carga efetiva pode se reduzir para menos de 15% da receita bruta, além de proporcionar ganhos de governança e de proteção do patrimônio.

Todavia, o debate sobre a tributação de lucros e dividendos deve ser acompanhado com atenção: caso implementado, poderá reduzir parte da vantagem hoje existente na distribuição de resultados das holdings, exigindo que empresários e investidores revisitem seus planejamentos tributários e societários.

Portanto, a mensagem é clara: a exploração da atividade de locação de imóveis, via Holdings, tende a se tornar inevitável, mas sua configuração ótima dependerá não apenas da Reforma já aprovada, como também de novas reformas em tramitação, em especial no campo do Imposto de Renda, sobre lucros e dividendos.


Postado por:
Cléberson Rodolfo Vieira Schwingel

cleberson@sl.adv.br