O Triunfo do Caráter Pessoal: O Direito ao ISS Fixo para Sociedades de Profissionais e a Ilegalidade das Barreiras Municipais


A carga tributária brasileira é um desafio constante para as sociedades que prestam serviços de natureza profissional, como advogados, médicos, arquitetos e contadores. O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) é, frequentemente, o ponto central de litígios, em especial no que tange à aplicação do regime de tributação diferenciada. A base legal para este benefício, previsto no Artigo 9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei nº 406/1968, estabelece que as sociedades uniprofissionais (SUPs), cujos serviços são prestados em caráter pessoal, devem recolher o imposto em valor fixo anual por profissional habilitado, e não com base no faturamento bruto (alíquota percentual). A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) experimentou um crescimento exponencial na última década, consolidando a tese de que a natureza jurídica adotada pela sociedade é irrelevante para a fruição desse benefício, ampliando sobremaneira a possibilidade de êxito para os contribuintes.

O entendimento pacificado pelo STJ, inclusive sob o rito dos recursos repetitivos (a exemplo do REsp n° 2.162.487/SP – Tema 1323), é claro e favorável aos contribuintes. A Corte fixou a tese de que "A adoção da forma societária de responsabilidade limitada pela sociedade uniprofissional não constitui, por si só, impedimento ao regime de tributação diferenciada do ISS por alíquota fixa". Este posicionamento reforça decisões anteriores, como a do PUIL nº 3.608/MG, que já reconhecia o direito de sociedades médicas constituídas como Limitada (Ltda.) ao ISS Fixo. O elemento-chave é a ausência de natureza empresarial e a predominância do caráter personalíssimo do serviço, com responsabilidade técnica individual dos sócios, ainda que com o auxílio de colaboradores ou distribuição de lucros. Em suma, o fisco deve analisar a atividade efetivamente exercida (o "ser" da sociedade) e não apenas a sua "vestimenta" formal (o "parecer" Ltda.).

No entanto, a consolidação da jurisprudência em nível federal esbarra na teimosia e nas ilegalidades das leis municipais, que insistem em impor requisitos restritivos para o enquadramento no ISS Fixo, violando a hierarquia das normas e o espírito do Decreto-Lei. O Código Tributário de Maringá (Lei Complementar n° 677/2007) é um exemplo paradigmático, ao listar uma série de impedimentos em seu Artigo 68, § 12, que buscam descaracterizar a sociedade uniprofissional. Entre as vedações, estão cláusulas que o STJ já considerou irrelevantes, como:

  • Ter sócios com mesma habilitação profissional.
  • Ter sócios que participam de outra sociedade ou que delas sejam sócios.
  • Estar constituída sob a forma de sociedade empresária.

Tais exigências são, em grande parte, ilegais e inconstitucionais por criarem óbices de natureza meramente formal que conflitam com o entendimento da Corte Superior de que o essencial é a estrutura não-empresarial da prestação do serviço. A Justiça, ao anular as glosas fiscais baseadas nesses requisitos, tem garantido que a sociedade de profissionais, desde que preste serviços com o caráter pessoal dos seus sócios, goze do tratamento tributário diferenciado, independentemente das formalidades contratuais ou cadastrais impostas pelas municipalidades.

Portanto, o momento é de "virada de chave" no contencioso tributário municipal. A via judicial se apresenta como a solução para anular os atos administrativos que desclassificam as sociedades por razões formais, reafirmando que, no Direito Tributário, a prevalência do substancial sobre o formal é o que determina o direito ao ISS Fixo. As sociedades que ainda não buscam esse enquadramento, por receio das leis municipais, devem reavaliar sua estratégia fiscal, pois a balança da Justiça pende agora, de forma clara, para o lado da valorização do trabalho pessoal dos profissionais liberais.


Postado por:
Cléberson Rodolfo Vieira Schwingel

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