Produtor Rural Pessoa Física ou Jurídica?


Nos últimos anos, tem sido observado um crescente movimento de incentivo aos produtores rurais para que contabilizem o resultado de suas atividades como pessoa jurídica e não como física, o que ocorre tradicionalmente. Como se trata de uma opção, é preciso que se faça uma análise mais apurada a fim de que se verifiquem as vantagens e desvantagens, bem como as implicações, na adoção de um ou outro modelo. O produtor rural sempre deve ser assessorado por um profissional da área jurídica e contábil, independente de tratar-se de pessoa física ou jurídica. Ainda assim, também é essencial que entenda, ao menos em parte, do mecanismo que reúne todas as informações de sua atividade e apura os resultados obtidos. Aquele que exerce a atividade rural (agricultura, pecuária, extração e exploração vegetal e animal, a transformação de produtos decorrentes da atividade rural, etc.), como pessoa física, está sujeito ao pagamento de Imposto de Renda à alíquota de até 27,5% que incidirá sobre a diferença entre as receitas e as despesas no respectivo ano base. Considerado como a utilização de recursos, tendo por objetivo “o desenvolvimento da atividade para expansão da produção ou melhoria da produtividade agrícola”, o investimento na atividade rural, assim como as despesas de custeio, é visto como despesa para fins de apuração da base de cálculo do Imposto de Renda. É importante observar que tanto a pessoa física quanto a jurídica que explorem atividade rural podem compensar eventuais prejuízos em anos posteriores, desde que, no caso da empresa, apurem seus tributos federais pelo lucro real. Para fins de apuração do resultado da atividade rural e consequente incidência de Imposto de Renda, a pessoa física deve manter escrituração de livro caixa (dispensado em caso de receita bruta total inferior a R$ 56.000,00), no qual são lançadas todas as receitas, despesas de custeio e investimento, etc. A própria Receita Federal disponibiliza em seu site um aplicativo específico para tal finalidade. Vale observar que a escrituração deve ser sustentada por documentos idôneos que identifiquem corretamente a transação e as partes envolvidas, sendo passível de fiscalização, lembrando que se trata de imposto sujeito a lançamento por homologação (o contribuinte declara os valores com base nos documentos que devem ser mantidos em arquivo e o fisco, segundo suas regras, concorda ou não com o lançamento). Caso não haja escrituração, tal qual determinado em lei, a Receita poderá lançar o imposto à alíquota de 20% a incidir sobre a receita bruta do respectivo ano calendário. Ainda é possível, por exemplo, a dedução (como custeio da atividade rural) do valor, a título de aluguel, descontado de empregado (desde que conste do contrato de trabalho ou que haja contrato de locação) que habite em imóvel localizado na respectiva propriedade rural. Tal receita, contudo, deve integrar o ajuste anual, estando sujeita ao recolhimento mensal do carnê-leão. Quanto à constituição de pessoa jurídica, o Código Civil assegura “tratamento favorecido, diferenciado e simplificado ao empresário rural e ao pequeno empresário, quanto à inscrição e aos efeitos daí decorrentes”. Observa-se a tentativa de facilitação para o produtor rural formalizar-se como empresário. Mas qual a vantagem se a legislação já oferece benefícios diferenciados enquanto pessoa física? Além da diferença nas alíquotas a título de impostos, é preciso considerar outra questão. O produtor rural, seja ele pessoa física ou pessoa jurídica individual, está sujeito de forma ilimitada, salvo exceções, às obrigações contraídas junto a terceiros. Quando há constituição de pessoa jurídica, formada por dois ou mais sócios, de caráter limitado, cada sócio responde pelo valor de suas quotas e todos, solidariamente, pela integralização do capital da sociedade, conforme determina o Código Civil. Isso quer dizer que a sociedade oferece certa proteção, limitando a responsabilidade das pessoas físicas, o que, por si só, é um enorme atrativo. Não sem motivo é que muitos produtores rurais passaram a constituir “holdings” (empresas controladoras ou administradoras de patrimônio) com característica familiar e de exploração rural, passando a integralizar as cotas da empresa mediante a transferência de bens, especialmente os imóveis, o que facilita, em muito, a transferência patrimonial em vida, além de atrair considerável redução da carga tributária. Vale também lembrar o entendimento (ainda não pacífico) acerca da interpretação de dispositivo do Decreto Lei n. 167/67 (que trata dos títulos de crédito rural) que proíbe (considera como nula) garantias, sejam pessoais (aval) ou reais (hipoteca, por exemplo) que tenham sido oferecidas por terceiros. As exceções ficam por conta de operação emitida por pessoa jurídica em que a garantia tenha sido prestada pela própria empresa, por um ou mais dos sócios dela participante ou por outra empresa. Caso haja opção pela constituição de uma sociedade, haverá obrigação e pagamento de diversos encargos e contribuições, da mesma forma que as demais empresas. Ainda assim, há benefícios às empresas de produtores rurais, sendo que “os bens do ativo imobilizado (máquinas e implementos agrícolas, veículos de cargas e utilitários rurais, reprodutores e matrizes etc), exceto a terra nua, quando destinados à produção, podem ser depreciados, integralmente, no próprio ano-calendário de aquisição. Também é possível a compensação dos prejuízos fiscais, decorrentes da atividade rural, com o lucro da mesma atividade, sem que seja aplicado o limite de 30%, desde que a empresa opte em apurar seus tributos federais pelo lucro real. A empresa poderá aderir à forma de apuração pelo lucro real ou presumido, sendo esta última a mais comum, pois é uma forma simplificada de apuração da base de cálculo do Imposto de Renda e da Contribuição Social, pela qual as despesas da empresa são desconsideradas. Já no caso da apuração pelo lucro presumido e, para a incidência das alíquotas do IRPJ (15%) e da CSLL (9%), a lei atribui (por isso presumido) um percentual de lucro que, no caso da atividade rural é de 8%, desde que o faturamento bruto anual não exceda a R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais). Com isso, sujeitam-se ao pagamento dos seguintes encargos: COFINS, PIS, IRPJ, adicional de IRPJ, CSLL, INSS sobre folha de pagamentos e, IPI em caso de industrialização. Em ambas as situações (lucro real ou lucro presumido), as empresas que exploram atividades rurais também estão sujeitas ao ICMS sobre as receitas de suas comercializações. Para as empresas que faturam até 3.600.000,00 (três milhões e seiscentos mil reais) será possível aderir ao Simples Nacional que consiste em um sistema tributário diferenciado e simplificado com alíquotas mais atrativas e agregadas com a seguinte incidência progressiva: Receita Bruta em 12 meses (em R$) Alíquota Até 180.000,00 4,00% De 180.000,01 a 360.000,00 5,47% De 360.000,01 a 540.000,00 6,84% De 540.000,01 a 720.000,00 7,54% De 720.000,01 a 900.000,00 7,60% De 900.000,01 a 1.080.000,00 8,28% De 1.080.000,01 a 1.260.000,00 8,36% De 1.260.000,01 a 1.440.000,00 8,45% De 1.440.000,01 a 1.620.000,00 9,03% De 1.620.000,01 a 1.800.000,00 9,12% De 1.800.000,01 a 1.980.000,00 9,95% De 1.980.000,01 a 2.160.000,00 10,04% De 2.160.000,01 a 2.340.000,00 10,13% De 2.340.000,01 a 2.520.000,00 10,23% De 2.520.000,01 a 2.700.000,00 10,32% De 2.700.000,01 a 2.880.000,00 11,23% De 2.880.000,01 a 3.060.000,00 11,32% De 3.060.000,01 a 3.240.000,00 11,42% De 3.240.000,01 a 3.420.000,00 11,51% De 3.420.000,01 a 3.600.000,00 11,61% Se a empresa rural concomitantemente industrializar e comercializar, a cada faixa de tributação do Simples Nacional será acrescido 0,5% a título de IPI. Diante de tal situação, os produtores rurais, os quais tradicionalmente exploram sua atividade como pessoas físicas, têm outras opções que, em determinadas situações, podem mostrar-se atrativas, oferecendo maior organização, segurança e menor pagamento de tributos além de ainda ajudar a resolver problemas sucessórios. Fábio Lamonica Pereira Advogado em Direito do Agronegócio Cléberson R. Vieira Schwingel Advogado Tributarista * Publicado na edição n. 64 da Revista AgroDBO


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Fábio Lamonica Pereira

Advogado em Direito do Agronegócio

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