Leilão de Terras


O dito popular de que um mal acordo é melhor que uma boa demanda realmente parece acertado e merece ser considerado. Nosso emaranhado de leis leva a certa insegurança jurídica na medida em que é possível prever (ainda que nebulosamente), mas não assegurar, determinado resultado a ser obtido com a propositura de uma medida judicial. Diversos são os fatores envolvidos ao trilhar o caminho do judiciário, tais como os fatos como realmente aconteceram, as provas existentes (documentos, testemunhas, perícias, etc.), o andamento do processo que depende de leis específicas (com relevantes alterações com validade já a partir do ano de 2016) o que geralmente leva alguns (ou muitos) anos até a resolução final. Obviamente, mesmo que iniciado determinado processo, nada impede que as partes cheguem a bom termo e interrompam a disputa. Situação muito comum no meio jurídico e que não raro envolve produtores rurais, diz respeito a venda de bens (sejam móveis ou imóveis) por determinação judicial para o pagamento de determinado débito. Assim, por exemplo, havendo um produtor com dívidas junto à uma instituição financeira, uma área de terras poderá ser penhorada e vendida judicialmente para que o suposto débito seja quitado. Bom, neste caso, diversos são os detalhes a serem observados para que o devedor não seja ainda mais penalizado. Assim é que o bem deve ser criteriosamente avaliado (há diversos requisitos a serem cumpridos), especificando-se o valor de mercado (que deve ser apurado mediante pesquisa junto a fontes confiáveis), bem como constar as benfeitorias existentes (e sua respectiva avaliação devidamente individualizada). Em caso de dúvida fundamentada é possível que seja solicitada nova avaliação e até mesmo nomeado um perito com conhecimentos específicos. Veja que se trata de um negócio atrativo para terceiros investidores uma vez que é possível a aquisição de bens pelo valor da avaliação, na primeira tentativa de venda, e a partir de 50% sobre referido valor na segunda oportunidade. O valor arrecadado, então, será utilizado para o pagamento do montante buscado pelo credor, além de custas e outras despesas. O saldo porventura restante pertence ao devedor. Apesar de aparentemente simples, tal procedimento é permeado de detalhes e, por vezes, pode acarretar em grandes problemas para o adquirente que deve analisar (preferencialmente amparado por profissional devidamente capacitado), cuidadosamente, o processo ao qual o bem esteja vinculado. É preciso verificar as decisões, eventuais recursos ainda pendentes de julgamento, ônus que constem, ou não, do edital, etc. Em áreas rurais os cuidados devem ser redobrados, isso porque há leis específicas a serem observadas, como o Estatuto da Terra que trata, dentre outras coisas, dos contratos de arrendamentos, que protegem a pessoa do arrendatário. Caso a área rural se encontre arrendada, o arrematante (aquele que compra o bem em venda judicial) precisa ter ciência de que o contrato de arrendamento deverá ser respeitado, assim como ocorre em uma compra e venda tradicional. Surpresas podem surgir uma vez que os contratos de arrendamento podem ser firmados até mesmo verbalmente, podendo ser provados por meio de testemunhas, sendo comum a estipulação de vigência por longos anos. Além disso, o contrato de arrendamento não precisa ser registrado na matrícula do imóvel para que tenha validade contra terceiros e assegure, até mesmo, o exercício do direito de preferência por parte do arrendatário. Situações outras podem acontecer em relação às lavouras porventura implantadas (soja, milho, trigo, cana, reflorestamento, etc.) na área objeto de penhora. Isso porque tais bens são considerados como móveis por acessão, não integrando a chamada terra nua, tendo, pois, seu valor em separado devendo assim ser consideradas, como já decidiu o judiciário em diversas situações (e de acordo com o que determina o próprio Código Civil). Assim, caso a lavoura pertença ao devedor e não tenha integrado a penhora, este tem o direito de colher os frutos e, dependendo da situação, até mesmo ser indenizado. Se lavoura pertencer ao arrendatário, o contrato deverá ser respeitado sob pena de o arrematante ser obrigado a pagar a correspondente indenização, o que pode incluir tanto o que perdeu quanto o que deixou de ganhar, além de possíveis danos morais, etc., analisado o caso concreto. O mecanismo de venda judicial deve ser rigorosamente estudado, tanto pelos interessados em eventual aquisição quanto pelos que estão sofrendo ou já sofreram o trauma da alienação forçada a fim de que as ilegalidades sejam afastadas. De toda forma, sendo possível evitar tal desfecho dramático, o acordo deve ser ponderado. Fábio Lamonica Pereira Advogado em Direito do Agronegócio Publicado na edição n. 66 da Revista AgroDBO


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Fábio Lamonica Pereira

Advogado em Direito do Agronegócio

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