Agiotagem no agronegócio
O termo “agiotagem” ou ”usura” identifica a prática de empréstimo mediante o pagamento de juros abusivos, sendo que a Lei até mesmo tipifica a conduta como crime. Porém, o que são juros abusivos? Em regra, as instituições financeiras estão legalmente autorizadas a cobrar taxas de juros que são fiscalizadas pelo Banco Central. Por isso, em princípio, é possível, infelizmente, a cobrança de juros cujas taxas superam facilmente 10% ao mês. Dessa forma, as limitações ficam por conta da média de mercado segundo o tipo de contrato. Para operações de crédito rural, contudo, os juros não podem ser superiores a 12% ao ano, exceto para os casos em que o Banco Central autorizar expressamente. No que tange a empréstimos entre particulares, ou seja, quando não há envolvimento de instituição financeira, a limitação é diferenciada. Ainda está em vigor a chamada Lei da Usura (Decreto n. 22626/33) que limita os juros nos empréstimos entre particulares, que passa a ser interpretada em consonância com as normas do Código Civil. Com isso, o entendimento é o de que os juros não podem ser superiores a efetivos 12% ao ano (mesma situação para os empréstimos rurais em que não há autorização diversa por parte do Banco Central). Constatada, pois, a cobrança de juros abusivos, o atual entendimento do judiciário é o de que deverá haver limitação nos patamares legais, ou seja, em efetivos 12% ao ano, sendo que o devedor tem o direito de ser ressarcido dos valores pagos indevidamente. Ocorre que os empréstimos ilegais muitas vezes estão vinculados à emissão de instrumentos de confissão de dívida, emissão de Notas Promissórias, oferecimento de bens em garantia, etc., tudo realizado para garantia do recebimento do crédito, comprometendo o patrimônio do devedor. Por essa razão, há grande dificuldade em demonstrar os abusos cometidos em contratos firmados entre particulares. A própria Lei, todavia, permite que o juiz, ao verificar indícios de agiotagem, determine que o credor demonstre a regularidade do direito que alega ter, o que se caracteriza como “inversão do ônus da prova”, segundo previsto pela Medida Provisória n. 2172-32/2001. Esse mecanismo ajuda a inibir práticas de agiotagem que acabam por espoliar o patrimônio de muitos que, por não encontrarem opções, acabam por se render às exigências ilegais de tais credores. No agronegócio, é possível identificar ilegalidades praticadas por pessoas físicas, empresas, cooperativas, tradings, etc. que se utilizam de instrumentos legais (títulos de crédito, contratos de compra e venda de produtos agrícolas, instrumentos de confissão de dívida) para acobertar ilegalidades. É comum a prática de simulação na venda/compra de produtos agrícolas, nos recursos efetivamente liberados para custeio/investimento, e outras operações que ocultam o real valor exigido dos produtores, diga-se, significativamente maior que o permitido pela Lei. O negócio jurídico simulado, ou seja, realizado com a intenção de encobrir a verdade, é nulo, ineficaz, como se não existisse. Nesses casos, é possível a declaração judicial da nulidade do negócio jurídico com a exclusão das respectivas ilegalidades. Vale lembrar também que os acordos (até homologados judicialmente) podem ser declarados nulos ou anulados, conforme o caso, se houver prova de que há ilegalidades acobertadas na origem, restabelecendo-se os limites legais. Assim, caso o produtor tenha necessidade de se utilizar de fontes alternativas de financiamento poderá se prevenir contra eventuais abusos e, sendo necessário, o judiciário estará à disposição para estabelecer os limites legais. Fábio Lamonica Pereira Publicado na edição n. 84 da Revista AgroDBO
Postado por:
Fábio Lamonica Pereira
Advogado em Direito do Agronegócio
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